No Canto IV da Eneida, Virgílio parece valer-se de tópicas do gênero elegíaco ao narrar o malfadado amor entre Dido e Enéias, inserindo-as dentro do gênero épico. Algumas características fundamentais do amante elegíaco, a saber, o furor pelo qual é tomado ao ser ferido pelas flechas do Cupido, a ócio dos amantes enquanto tais, a mala fama que advém desse amor, e, por fim, a condição misera na qual o amante se encontra, diante da qual é sempre feito um lamento, mostraram-se presentes na composição poética do Canto IV. Para além, então, de demonstrar como o gênero épico, sem perder seu rigor formal, subsume outros gêneros, neste caso o elegíaco, este artigo também procura observar como esta operação acaba por servir tanto ao propósito intranarrativo como extranarrativo de Virgílio ao escrever sua Eneida. No primeiro caso, se lembrarmos que os cantos I ao VI ocupam-se da construção do ἦθος heroico de Enéias, a recusa do herói em permanecer com a rainha confirma, mais uma vez, seu destino, que é a fundação de Roma, destino esse que é próprio de um herói épico – e não de um amante elegíaco. Já no segundo caso, é necessário, primeiro, ter em mente a intenção de Virgílio ao compor a Eneida, que é a inserção da história de Roma no mito, o qual, vale lembrar, é a matéria narrativa do próprio poema épico. Dessa forma, o abandono de Dido e a imprecação que a rainha realiza dos versos 590-640 é utilizada pelo poeta para justificar, ainda que ironicamente, a rivalidade e violência dos cartagineses contra os romanos nas Guerras Púnicas, colocando-as como resultado da frustração amorosa de uma mulher.
In Aeneid’s book IV, Virgil makes use of elegiac topics while narrating Dido and Aeneas’ ill-fated love, inserting these topics into the epic genre. Some key characteristics of elegiac lover, such as the furor by which he is taken when injured by Cupid’s dart; lover’s idleness; the mala fama that emerges from the love affair; and, lastly, the misera condition in which the lover is thrown to, always followed by a lament; all these has shown to be present in Aeneid’s book IV. So, in addition to evincing how epic genre, without losing its formal rigour, subsume other genres, in this case the elegiac one, this article observes how this procedure takes part in both Vergil’s intra-narrative and extra-narrative purpose when composing Aeneid. In the first case, if we bear in mind that books I to VI are concerned with the construction of Aeneas’ heroic ἦθος, the hero’s denial in staying together with the queen confirms, once again, his destiny, which is Rome’s foundation, that is conventionally of an epic hero – and not of an elegiac lover. As for the second one, it is first important to be aware of Vergil’s aim when composing Aeneid, which is to insert Rome’s history into a myth, which is the elegiac poem itself. Therefore, Dido’s abandonment and her following imprecation in verses 590-640 are used by the poet to justify, even if ironically, Carthaginians’ rivalry and violence against Romans throughout the Punic Wars, putting them as the result of a woman’s love frustration.
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