Brasil
O presente artigo parte do poema "Tiranias", publicado no livro Visão do Térreo, do brasileiro Ruy Proença, para pensar a maneira como a literatura angolana, que se faz em oposição aos autoritarismos, variou de uma estratégia realista para um apelo ao insólito, como forma de representar e de se opor a momentos históricos marcados pela violência dos que governam. No poema, Ruy Proença postula que antes as paredes tinham ouvidos, mas hoje os ouvidos têm paredes. Por isso, de nada adianta gritar. O grito, que parece remeter a uma representação da estratégia realista passa a dar lugar a uma estética do absurdo, ouvidos com paredes, que se relaciona com um cenário político marcado pelo contrassenso. A análise pretende-se a discutir dois contos: "O cipaio Mandombe", escrito em maio de 1962, pelo angolano António Cardoso e "O triste fim de Jair Messias Bolsonaro", publicado em setembro de 2019, pelo também angolano José Eduardo Agualusa. O trabalho também intenta pensar uma abertura da literatura angolana contemporânea para além do seu território nacional, justificando assim a relação estabelecida com o Brasil no conto de Agualusa, bem como o uso do poema brasileiro como aporte teórico para se pensar a narrativa angolana. Assim, o apelo ao insólito, estaria relacionado ao diagnóstico de uma problemática transnacional, que irmana condições semelhantes em países distintos.
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