efdeportes.com
O guarda-redes de Andebol

   
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
(Portugal)
 
 
Emanuel Casimiro
emanuelcasimiro@yahoo.com
 

 

 

 

 
Este trabalho foi no âmbito da disciplina de Opção I - ANDEBOL, do terceiro ano da
Licenciatura em Educação Física e Desporto da Universidade de
Trás-os-Montes e Alto Douro, leccionada pela Dr.ª Isabel Gomes.

“Intervenções desequilibradas e positivas em circunstâncias desfavoráveis,
fora das normais, definem a condição e qualidade internacional dos Guarda-redes.”
Domingo Barcenas

Agradecimentos
    Este trabalho foi o produto de algumas horas de esforço e dedicação para cumprir um objectivo desde há algum tempo planeado. Sem a colaboração de algumas pessoas não teria sido possível a elaboração de um trabalho desta envergadura.
    Em primeiro lugar gostaria de agradecer à Dr.ª Isabel Gomes, docente responsável pelo Gabinete de ANDEBOL da UTAD e nossa docente da Opção I - ANDEBOL pela disponibilidade ajuda preciosa e pelo esclarecimento prestado acerca de alguns itens integrantes deste trabalho.
    Ao Herlander Silva pelas horas incansáveis de discussão acerca de variados temas e pela bibliografia de apoio ao trabalho que me facilitou.
    Ao Sérgio Cabrita pela disponibilidade demonstrada e pela ajuda prestada na pesquisa bibliográfica.
    Ao João Varejão pela disponibilidade que demonstrou desde o inicio em me poder ajudar.
    Ao Mestre António Cunha pelos elogios prestados, pelo apoio demonstrado e pela documentação prestada.
    A todos aqueles que de uma forma ou de outra contribuíram para a realização deste documento.

a todas estas pessoas o meu muito obrigado.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 57 - Febrero de 2003

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I. Introdução

    “O Guarda-Redes de ANDEBOL é o elemento mais importante da equipa”, deve ser uma das frases mais conhecidas no mundo do ANDEBOL. Infelizmente sabemos que na maioria dos casos os guarda-redes estão, muitas vezes, privados de uma preparação específica e sistemática. É, de certa forma, um panorama não muito animador mas que tem vindo a ser alterado ao longo dos anos muito por força do surgimento de grandes guarda-redes de classe mundial que começaram por ter um peso superior a 50% no rendimento final das equipas em competição, Czerwinski (1993); Equisoain (2000); González e Seco (1991); Gutierrez (2000); Pinto (s/d). Hoje em dia já se fazem alguns trabalhos só sobre o guarda-redes de ANDEBOL, abordando-o, assim, de uma forma especial. Apesar de ser considerado especial devemos ter em conta que o seu treino não deve ser completamente isolado, este é membro de uma equipa com mais seis jogadores, o que pretendemos dizer é que o guarda-redes deve sim ter um treino especializado diferente dos outros jogadores mas, também deve ser tido em conta o treino conjunto de determinadas situações, tais como a colaboração com a defesa e a capacidade de iniciar tanto o ataque rápido como o contra-ataque da sua equipa em situação de jogo, Equisoain (2000).

    De todos os estudos que analisamos na elaboração deste trabalho a maior concordância existente entre eles é a escassa bibliografia que existe publicada sobre o assunto, especialmente em Portugal.

    Com este trabalho pretendemos abordar de uma forma clara e objectiva qual a importância do guarda-redes de ANDEBOL na sua equipa, como escolher um guarda-redes na iniciação e de que forma deve ser treinado/ensinado. Tentámos simplificar os conceitos, explicando-os e fazendo alguns comentários pessoais em relação a estes, tendo como base toda a nossa experiência como “andebolistas” e a nossa posição como formandos de uma especialização nesta modalidade num curso superior de Educação Física e Desporto.

    Não pretendemos, assim, sermos possuidores da verdade absoluta, pois também não é o que se pretende, mas podemos sim tentar alhear todo o conhecimento adquirido ao longo desta pesquisa a experiência adquirida ao longo de alguns anos e tentar partilhá-la de forma que nós mesmos ou outros colegas possamos no futuro dar continuidade a todo este trabalho, que aqui iniciamos. Se todos pensássemos da mesma forma não haveria evolução.

    A todos aqueles que estudam ou que estão ligados ao ANDEBOL aqui deixamos o nosso sincero contributo.

II. Objectivos

    Este trabalho teve como principais objectivos:

  • Esclarecer de forma clara, sucinta e objectiva qual o papel do guarda-redes de ANDEBOL numa equipa hoje em dia;

  • Apresentar quais as principais características que devemos procurar num guarda-redes ;

  • Esclarecer quais os aspectos técnico-tácticos do guarda-redes, passando pelas escolas de guarda-redes e origem das técnicas.


III. A importância do Guarda-Redes de ANDEBOL

    Ao longo dos tempos o guarda-redes tem vindo a ocupar um lugar de grande destaque numa equipa de ANDEBOL. É considerado por todos como o jogador mais importante e onde, na maior parte das vezes, se centram todas as atenções de um jogo devido ao facto de este poder ser o elemento mais desequilibrador e influenciador do resultado final.

    Não podemos, de qualquer forma, dar uma importância exagerada a este posto específico menosprezando os índices de rendimento dos outros colegas de equipa, Barcenas (s/d); Pinto (s/d);). Assim, para definir o autentico sentido da sua importância poderemos afirmar que num jogo equilibrado um maior número de intervenções positivas por parte do guarda-redes pode influenciar decisivamente o resultado, Barcenas (s/d).

    Na actualidade um bom guarda-redes pode influenciar decisivamente um jogo. Durante os períodos críticos do jogo pode defender a retaguarda da sua equipa transmitindo confiança e segurança aos seus colegas podendo, também, criar alguma insegurança e instabilidade aos adversários quando rematam à baliza, Barcenas (s/d); Federhoff e Stein (1995); Czerwinski e Taborsky (1997). Este ocupa uma posição excepcional na sua equipa. Por cada erro que comete este é castigado com um golo sem que ninguém o possa emendar, mas por sua vez tem a capacidade de poder corrigir os erros de todos os seus colegas de equipa, Equisoain (2000); Gutierrez (2000); Martini (1980); Pinto (s/d).

    Um outro papel importante que o guarda-redes tem é o de tentar manter uma boa harmonia entre a defesa e o seu trabalho, visto que o ANDEBOL é, essencialmente, um jogo colectivo. Nestas situações a sua função é influenciar a defesa de forma a que esta corresponda de acordo com as suas exigências específicas de forma a adaptar-se às suas qualidades formando, desta forma, um bloco defensivo com elevado grau de transposição. Pode-se dizer que um guarda-redes é meia equipa, Equisoain (2000). Verifica-se, assim que o trabalho do guarda-redes não se limita apenas à defesa da baliza, este também toma parte do resto do jogo sendo desde o inicio o primeiro atacante pela sua capacidade de lançar os ataques rápidos (e contra-ataques), organiza a defesa em conjunto com os seus colegas e pode interceptar os contra-ataques da equipa contrária, Czerwinski e Taborsky (1997); Pinto (s/d).

    Um guarda-redes de baixa qualidade pode transformar uma equipa competitiva numa equipa medíocre, podendo o contrário também acontecer, i.e. um bom guarda-redes pode transformar uma equipa de fraca qualidade numa equipa competitiva. Clanton e Dwight (1997).

    Num jogo em que o guarda-redes alcance uma grande percentagem de acções defensivas pode influenciar decisivamente o resultado final, desta forma ele influencia positivamente os seus colegas transmitindo-lhes confiança e desmoralizando o adversário ao ponto de comprometer o desenvolvimento das suas acções técnico-tácticas ofensivas. Nestas situações temos que ter em conta que o inverso também pode acontecer, o guarda-redes pode ser o responsável pela desmotivação dos seus companheiros e pela crescente confiança ofensiva dos adversários, Pinto (s/d).

    O papel do guarda-redes é, assim, decisivo para o sucesso e para a prestação desportiva da equipa na medida em que, através de acções individuais pode influenciar os seus colegas e toda a organização ofensiva adversária. As suas intervenções são, muitas vezes, o principal contribuinte para a espectacularidade de um jogo.


IV. Principais qualidades de um guarda-redes de ANDEBOL

    Este capitulo do nosso trabalho foca vários aspectos relacionados com as características especificas do guarda-redes. De todas as posições dentro do campo o guarda-redes é aquele que desempenha as tarefas mais específicas e um trabalho mais isolado. Assim, podemos concluir que determinadas variáveis podem, de certa forma, ter uma enorme incidência na prestação deste jogador. Desta forma podemos dividir em quatro grupos as qualidades que pretendemos encontrar num guarda-redes de ANDEBOL:

  • Qualidades Somáticas;

  • Qualidades Psicológicas;

  • Qualidades Sensório-motoras;


1. Qualidades Somáticas

    Os critérios de eleição dos guarda-redes numa equipa de iniciação dependem em muito dos treinadores, estes têm muitas vezes normas determinadas de acordo com os escalões etários, nestes critérios estão incluídos não só as variáveis somáticas mas também as psicológicas e as sensório-motoras.

    Variáveis como (i) a altura, (ii) envergadura, (iii) diâmetro palmar e o (iv) peso desempenham, no campo das qualidades somáticas, um papel importante pois vão ter influência na técnica do guarda-redes, na sua capacidade de se deslocar dentro e fora da baliza, no acto da defesa em si e na própria pega da bola.

    Dentro de todos os jogadores que têm para “trabalhar” uns treinadores dão mais importância a umas características ou a outras. Por exemplo uns treinadores dão mais importância à altura enquanto que outros dão à envergadura ou ao diâmetro palmar e plantar, Gutierrez (2000). Infelizmente outros há que não têm qualquer tipo de critério e elegem o guarda-redes como aquele que não sabe fazer mais nada.

    È difícil eleger quais as características físicas ideais para um bom guarda-redes. Acerca deste facto Gutierrez (2000), afirma que jogadores mais altos tendem a ter os reflexos mais lentos do que os mais baixos.

    Actualmente os melhores guarda-redes apresentam elevados índices ao nível da altura e envergadura, estas são variáveis sobre as quais o treinador não pode ter qualquer tipo de influência. Desta forma ocupam um maior espaço diminuindo o angulo de remate dos seus opositores, têm mais facilidade em alcançar os ângulos da baliza. Estes são, assim, considerados factores não decisivos mas importantes no desenvolvimento de um bom rendimento das suas acções de defesa da baliza, Lemos (2001). Czerwinski (1993), acrescenta ainda que nos últimos dez anos a média de altura dos guarda-redes subiu mais do que sete centímetros, o que permite a um número elevado de guarda-redes uma maior eficácia defensiva dos remates aos seis e aos nove metros.

    Na relação altura/envergadura, Czerwinski (1993); Latiskevits (1991) cit. em Lemos (2001) referem que a envergadura deve ser sempre superior à altura, contudo entram em desacordo no que se refere à distância que a envergadura deve ter em relação à altura.

    No quadro que se segue apresentamos as qualidades somáticas que se esperam encontrar nos guarda-redes do sexo masculino segundo os vários autores analisados:


Quadro 1 - Qualidades somáticas que se esperam encontrar no guarda-redes masculino.1

    Lemos (2001) refere, nas conclusões do seu estudo, que as variáveis antropometrias altura e envergadura não são condicionantes da eficácia dos guarda-redes portugueses. No entanto, sabe-se que os guarda-redes de elevado nível internacional apresentam elevados valores de envergadura e altura. Este autor considera, assim, que estes factores não são decisivos mas sim importantes na obtenção de uma elevada performance por parte do guarda-redes de ANDEBOL.


2. Qualidades Psicológicas

    A nível psicológico as qualidades apresentadas não são, de forma alguma, estranhas a qualquer tipo de desportista. No guarda-redes estas têm um peso maior pois o este para além de ter que controlar os seus níveis de ansiedade, motivação e atenção durante um jogo tem como tarefa adicional provocar um efeito de tranquilidade nos seus colegas de equipa transmitindo-lhes confiança, motivação e segurança.

    “Independentemente dos valores estatísticos que objectivam a sua actuação, desde o ponto de vista psicológico, o seu comportamento influi de maneira decisiva, motivando os seus companheiros com as suas intervenções” (Lemos, 2001; pp. 27).

    Uma característica comum a todos os autores é o facto de consideram que o guarda-redes para além da sua condição física, das suas características somáticas e deve ser muito forte a nível psicológico. Christian Gaudin refere que sem a componente física nada poderia ser feito, mas a parte psicológica ocupa cerca de 80% do total das capacidades, Bem-Ismail (2001).

    Equisoain (2000), refere que um guarda-redes com uma elevada personalidade pode exercer uma superioridade psicológica decisiva sobre a sua ou sobre a outra equipa, i.e. mediante o seu comportamento activo influenciado pela sua superioridade psicológica, no desempenhar das suas tarefas, pode demonstrar que este se sente seguro e mais forte, ou não, em todas as situações. Ao demonstrar este tipo de segurança pode influenciar os jogadores contrários de forma a que estes cada vez falhem mais remates, é de ter em conta que o contrário também pode acontecer, se o guarda-redes demonstrar alguma insegurança os jogadores contrários ganham mais confiança para rematar à baliza.

    Toda esta estabilidade psicológica pode ser inata num guarda-redes, mas também deve ser um factor a ter em conta no processo de treino visto que estas qualidades podem ser exercitadas por forma a interagirem com as suas restantes qualidades, Gutierrez (2000).

    Pinto (s/d), no estudo que efectuou, refere-se às qualidades volitivas do guarda-redes: Coragem, Combatividade, Concentração, Atenção, Espírito de Decisão, Autoridade, Autonomia, Vontade, Disciplina, Auto-disciplina, Responsabilidade, Sacrifício e Controlo das emoções.

    Pensamos que estas qualidades não são de todo treináveis pois a conclusão a que chegamos prende-se com o facto de todas estas se poderem evidenciar mais ou menos em função das qualidades psicológicas do guarda-redes a que fizemos referência anteriormente.


3. Qualidades Sensório-motoras

    Já desde há algum tempo que o guarda-redes é reconhecido como ocupando um lugar de mais de 50% no “peso” de uma equipa de ANDEBOL. Bayer, (1987) refere que o treinador deve ter em conta as qualidades necessárias para que se jogue como guarda-redes das quais destaca: as morfológicas (referidas anteriormente), o tempo de reacção, a coordenação geral e a resistência geral.

    Na pesquisa bibliográfica efectuada encontramos um conjunto de qualidades sensório-motoras referidas pelos autores como sendo as mais importantes a desenvolver no guarda-redes: (i) tempo de reacção complexo, (ii) velocidade de antecipação, (iii) velocidade de execução, (iv) mobilidade, (v) potência (vi) flexibilidade, (vii) coordenação, (viii) agilidade, (ix) resistência específica, (x) força e (xi) impulsão. Quando procuramos um jogador que possa ocupar a posição de guarda-redes devemos ter em conta algumas qualidades a procurar, no entanto temos que ter em atenção que não existe um guarda-redes que evidencie todas as qualidades que procuramos a nível sensório-motor e não só, Martini (1980). Zeier (1987) acrescenta que só com uma base de preparação física sólida e o exaltar das capacidades podem dar origem à técnica e que através dela os outros factores exigidos podem ser desenvolvidos harmoniosamente.

    Olson (2001), refere que todas as técnicas exigem do guarda-redes uma boa condição física que se pode operacionalizar num bom nível de resistência, força, agilidade e flexibilidade.

    Na proposta de formação do guarda-redes que apresentam González e Seco (1991), referem que ao nível das exigências motoras um bom guarda-redes deve possuir:

Uma boa mobilidade a nível de:

  • Articular;

  • Flexibilidade;

  • Elasticidade

  • Agilidade.

Uma boa coordenação:

  • Global;

  • Viso-motora;

  • Óculo-manual.

Uma boa velocidade:

  • De reacção;

  • De deslocamento.

Bons níveis de força:

  • Geral;

  • De pernas.

Uma boa resistência:

  • Geral;

  • Especifica.

    Estas são assim como as qualidades sensório-motoras prioritárias que devem ser desenvolvidas em treino, mediante as características dos atletas com quem estamos a trabalhar.

    Segundo Czerwinski (1993) o elemento mais importante que tem influência na eficácia do jogo do guarda-redes é o tempo de reacção.

    O tempo de reacção é definido como o tempo que decorre entre o inicio do estímulo e o inicio da resposta solicitada. Este tempo de reacção pode ser dividido em dois tipos:

  • Tempo de reacção simples -» É o tempo que separa uma excitação sensorial de uma resposta motriz que o atleta já conhece previamente. Implica uma resposta simples a um estímulo já conhecido;

  • Tempo de reacção complexo -» É uma variante do tempo de reacção que se manifesta muito na actividade física em que a sua característica mais significativa é a variedade de estímulos a que o atleta tem que atender, bem como às suas enormes possibilidades de resposta. De entre uma variedade de estímulos o atleta terá que eleger, dentro das várias respostas possíveis, a mais adequada para alcançar o máximo rendimento desportivo.
    Castelo (1998).


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